sábado, 3 de outubro de 2015

Desemprego, empobrecimento, dívida pública, emigração e inércia

Há um princípio fundamental da Física que se aplica a muitos domínios para além da Física, mas que é mal compreendido pela maioria das pessoas, até por alguns físicos. É o princípio da inércia. Na prática é difícil de compreender que qualquer corpo em movimento seguirá movendo-se se nenhuma força se exercer sobre ele. Pois se eu quero que o meu automóvel continue a andar numa estrada plana, terei de manter o pé no acelerador. Se eu der um valente pontapé numa bola, ela acabará por parar sem que eu veja nenhuma força a forçá-la a deixar de rebolar pelo chão fora. Forças como o atrito ou a resistência do ar não são intuitivos. Daí que o fenómeno da inércia não seja bem compreendido. Mas quando o tempo começa a arrefecer, como agora no Outono, a minha casa mantém uma temperatura agradável durante alguns dias quando lá fora já está mais fresco. Até a nível planetário se observa o fenómeno do retardamento da alteração da temperatura após os solistícios. O Verão começa cerca de 21 de Junho, mas o pico do calor dá-se em Agosto. Do mesmo modo, o solistício do Inverno é à roda de 21 de Setembro, que é o dia mais curto do ano, mas o mês mais frio é Dezembro. É a chamada inércia térmica. A inércia provoca portanto um desfasamento entre a  causa e o efeito, um retardamento do efeito em relação à causa.

O conceito de inércia aplicado ao campo da macroeconomia é mal compreendido pela generalidade das pessoas. Daí que os governos sejam frequentemente louvados ou castigados pelos efeitos ao retardador de decisões tomadas pelos governos anteriores. No caso concreto da situação portuguesa, quem olha para as curvas do desemprego, para as variações do PIB, para a variação da dívida pública e para outros fenómenos relacionados com a crise culpa frequentemente o governo em funções nesse momento. De modo inverso, um governo pode ser considerado mais eficaz por aproveitar dos efeitos de estímulos positivos de governos anteriores.

Claro que esta longa introdução tem por fim ilustrar o engano em que muitas pessoas caem e que alguns políticos aproveitam sobre a situação actual em Portugal. O governo de Sócrates criou todas as condições para uma crise económica, gastando demais, investindo em projectos não rentáveis e promovendo o endividamento. A crise internacional ajudou e veio tornar inevitável o pedido de ajuda que Sócrates não queria e a que só tarde recorreu por já não haver outra solução. Os efeitos da situação catastrófica do País e das duras condições negociadas com a troika para podermos aceder a um empréstimo indispensável só se tornaram evidentes mais tarde, já durante o governo seguinte (o ainda actual). E estes efeitos foram profundos e duráveis. Daí que uma observação descuidada possa concluir que, como durante o governo de Sócrates havia dinheiro a circular em quantidade, o desemprego era mais reduzido, os funcionários públicos e os pensionistas ganhavam mais e os impostos eram mais baixos, entre outros aspectos, ao passo que durante o governo de Passos Coelho, durante mais de 2 anos, o desemprego aumentou muito, os salários e as pensões sofreram cortes e os impostos tiveram um aumento colossal, o governo de Sócrates era bom e o actual governo é mau. Que muita gente pense assim, é natural, porque o efeito da inércia e do desfasamento entre causa e efeito nunca foi bem explicado. Já que haja políticos e economistas que apregoam estas conclusões é menos aceitável e é de admitir que o façam para enganar o público sabendo que não têm razão. Se não é um truque para enganar e pensam que têm razão, então é forçoso concluir que não têm as qualidades e a experiência mínimas para poder governar, caso contrário o que lhes falta é a idoneidade necessária para cargos de governo.

Sem comentários: