domingo, 30 de março de 2014

Menos desinformação, mas alguma

As notícias sobre a segunda volta das eleições municipais francesas pareceram-me, de um modo geral, mais correctas do que as da primeira volta, embora não possa concordar com a pouca importância que os 3 canais generalistas nacionais lhe deram nos noticiários das 20 h, remetendo-as para depois de todos os pormenores de informação sobre temas secundários, como operações stop e opiniões de Seguro. Além disso o tema foi tratado rapidamente e não com o relevo que, em minha opinião, mereceria. Mais grave foi o caso da Euronews, que salientou a "vitória" do Front National e o desastre do PSF, mas não acrescentou nem uma palavra sobre o partido que afinal ganhou as eleições, com mais votos, mais eleitos e mais câmaras (a UMP). Lapso ou esquecimento propositado?

quarta-feira, 26 de março de 2014

As eleições municipais francesas e a desinformação

Deixei passar uns dias desde primeira volta das eleições municipais francesas do último domingo não só por preguiça para escrever mas também para ter a certeza do que desconfiei desde Segunda de manhã: A comunicação social não soube ou não quis informar rigorosamente os resultados desta jornada. Tivesse sido um torneio de futebol e teríamos tido numerosos programas e reportagens, comentadores e especialistas a escalpelizarem os resultados. Mas toda a informação foi escassa, atrasada e incompleta. Vejamos:

As notícias focaram principalmente o avanço da extrema direita de Marine Le Pen, quer nos textos, quer nas imagens. Claro que este avanço, se bem que já esperado, foi digno de ser salientado. Mas chegar a omitir os resultados de outras formações para referir apenas a boa classificação do Front National não é certamente dar uma informação completa. Afinal, o Front National cresceu muito, mas a partir de uma base muito baixa, e ficou ainda muito aquém dos resultados dos principais partidos. Parece que o objectivo de salientar de tal modo a "vitória" da extrema direita era meter medo dum regresso do fascismo a países democráticos, fazendo temer a fragilidade da democracia.

Em segundo lugar, em muitas notícias os resultados da UMP foram omitidos. Nas notísias mais pormenorizadas, os resultados mais citados foram baseados nas primeiras projecções, que davam uma pequena diferença entre a UMP (47%) e o PSF (41%) e um crescimento do FN (7%) que não se confirmou, e não rectificaram posteriormente esses resultados, que afinal se afastavam dos finais. O Ministério do Interior francês divulgou, ainda no Domingo à noite, os dados globais e finais: Extrema esquerda: 0,58%; Esquerda: 37,74%; Direita: 46,54%, Extrema direita: 4,65%. Portanto a derrota da esquerda foi muito maior do que o anunciado com base em dados prematuros e o crescimento da extrema direita foi muito inferior ao inicialmente estimado, pouco mais de metade da projecção largamente noticiada. Os resultados oficiais estavam acessíveis para quem quisesse, mas, por exemplo o Expresso, às 21:48 de Domingo ainda só dava a projecção atrasada.

Espero que na segunda volta a informação seja mais completa e mais exacta.

terça-feira, 25 de março de 2014

A falta que faz um "c"

Já havia bastante confusão entre "correctores" (o que corrige) e "corretores" (o que trabalha em corretagem, ou seja, «age como intermediário em negócios particulares, especialmente aqueles que envolvem compra e venda de bens ou acções na bolsa de valores» [Dicionário Houaiss]), mas quem soubesse de ortografia podia distinguir as duas palavras pela presença do "c" em "correctores", o qual que servia para se saber que o "e" era aberto, isto é, se pronunciava como "é", ao contrário do "e" de "corretores" que é mudo, isto é, pronuncia-se como o "e" da palavra "de". Mas é evidente que o acordo ortográfico de 90 veio ainda aumentar a confusão: Agora, segundo este aborto ortográfico, as palavras passaram a ser homógrafas e, quando se pretende ler a palavra é preciso saber se serve para corrigir ou para corretar. Não sabe disto o jornalista da SIC que há dias, na notícia de que havia companhias que se dedicavam à venda de dados pessoais, lhes chamou "correctores" com "e" aberto e repetiu mais adiante a asneira, como se essas companhias corrigissem alguma coisa.

Os cortes de 2015

Vai por aí uma grande controvérsia sobre quanto e como é que o Governo vai cortar em 2015. O PS acusa o Governo de ter uma agenda escondida, mas sabe que os cortes serão da ordem de 2000 milhões de euros. O PCP não sabe quanto se cortará, mas sabe que os sacrificados serão os mesmos do costume. Marques Mendes arvorou-se outra vez em porta-voz não oficial do Governo e soube que o assunto foi discutido em conselho de ministros e que o corte será entre 1500 e 1700 milhões. Mas todos deploram estes cortes. Não consigo compreender o porquê de tanto alarido. Há muito que toda a gente sabe que de 2014 para 2015 o défice deve descer de 4% para 2,5%. Portanto não é preciso ser muito esperto nem saber muito de matemática para ter uma ideia de quanto terá de se reduzir na despesa ou aumentar na receita do Estado para conseguir esta baixa. As possibilidades de aumento de receita são muito reduzidas e portanto é na redução da despesa que vai residir a maior parte do ajustamento. A comunicação social decidiu designar como "cortes" qualquer redução de despesa. Os cortes serão pois inevitáveis e desde há muito previsíveis. Se serão da ordem de 2000 ou entre 1500 e 1700 milhões é questão de pormenor. A única incógnita é sobre que despesas cairão estes cortes. Claro que todos gostaríamos de ver esta incógnita levantada o mais cedo possível, mas é natural que não seja nos primeiros meses de 2014 que se poderá saber pormenores do orçamento para 2015. Sejam os cortes em salários, em pensões ou noutras rubricas, o certo é que, reduzindo o Estado os seus gastos, haverá menos dinheiro na economia. Quem duvida?

segunda-feira, 17 de março de 2014

Ainda a reestruturação da dívida

Uma explicação muito completa e dada com simplicidade dos possíveis modos de reestruturação, que mostra claramente a equivalência em termos de valor actual dum título de dívida de diversos modos de reestruturar é dada no blog A Destreza das Dúvidas por Luís Aguiar-Conraria. Esta explicação torna mais evidente a afirmação feita no Survey do FMI citado por mim a partir dda citação de Ferreira de Almeida no Quarta República de que «a cut in face value (debt reduction) … [and] a lengthening of maturities (debt rescheduling) … both types of debt operations can involve a “haircut,” i.e., a loss in the present value of creditor claims.»Conraria repete esta afirmação dum modo mais completo e mais compreensível: «Haircuts, reestruturações, alargamento de prazos, perdões de dívida e reduções de juros é tudo a mesma conversa. No fundo, é um default ou incumprimento (parcial) da nossa dívida. Chamar-lhes um nome diferente, qualquer ele que seja, é um mero eufemismo.» Ora nem mais.

domingo, 16 de março de 2014

Falar bem, falar mal português

Muito se tem falado do malfadado acordo ortográfico (que insisto em escrever com minúsculas, já que não lhe reconheço estatuto para maiúsculas). Mas nem uma palavra ao problema da má pronúncia da língua portuguesa, e não me refiro à pronúncia brasileira ou a qualquer outra dos países da CPLP mas sim de verdadeiras incorrecções de linguagem. Refiro-me ao modo como se fala português nas TVs.

Vejamos alguns exemplos: Na TVI em 2014-02-21 no Jornal Nacional: "Quando é cacaba? - ou - Quando é q'acaba?" Noutro canal não identificado: "Crescem os sinais de canível da UE ..." - (que a nível). Na TVI24 em 2014-03-03: "Pistorius diz cucacontece... " (que o que acontece). O próprio Marcelo Rebelo de Sousa, no dia 2014-03-09: "Quem é capoia..." (que apoia).

O verbo haver é alvo de contínuos assassinatos. Há pouco ainda na TVI: "Estima-se que hajam 15000 pessoas com sindroma de Down." Será mesmo que hão 15000?

sábado, 15 de março de 2014

Reestruturar ou não reestruturar, eis a questão

Não sei qual era o montante da dívida pública da Dinamarca no tempo do príncipe Hamlet, nem o da Inglaterra no tempo de Shakespeare. Até é possível que ninguém o saiba ao certo. Mas a questão hoje já não é “Ser ou não ser” sem mais, é “Ser ou não ser sustentável” ou, dito de outra maneira, reestruturar ou não reestruturar. O manifesto dos 70 teve o mérito de fazer agitar as águas e levar algumas pessoas a interessar-se por outros assuntos que não sejam futebol. Há muito que não havia tanta repercussão mediática e bloguística sobre um assunto realmente importante. Não me atrevi a dar uma opinião pessoal sobre o assunto até ter oportunidade de ler o manifesto na íntegra. Nessa altura verifiquei que já ia atrasado e que já toda a gente ou quase se tinha manifestado sobre o manifesto. Assim, decidi fazer uma pequena antologia das intervenções que me pareceram mais acertadas. O resultado exprime a minha opinião.

Em primeiro lugar, Tavares Moreira, no Quarta República defende que «avançar uma proposta de reestruturação sem antes ou simultaneamente cuidar de apresentar um projecto sério de Reforma do Estado parece-me algo de semelhante à velha ideia de “por o carro à frente dos bois”, suscitando um elevado risco de “moral hazard”» e que «os efeitos de uma iniciativa de reestruturação da divida tal como é sugerida pelo Manifesto, acabariam por ser totalmente opostos aos enunciados pelos seus ilustres subscritores...»
Outras intervenções no Quarta República juntaram argumentos à discussão. Pinho Cardão, por exemplo, num texto bem elaborado, lembra que «Nenhuma reestruturação é eficaz se não der prioridade ao equilíbrio económico.» e que a reestruturação abrangeria Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro detidos por particulares, para além de fundos da Segurança Social e de bancos.

Ainda no Quarta República, Ferreira de Almeida recomenda a leitura do documento do FMI “Sovereign Debt Restructurings 1950–2010: Literature Survey, Data, and Stylized Facts” que considera «elucidativo em muitos aspectos.» Não li e não sei se alguma vez chegarei a ler as 128 páginas deste documento, mas procurei os capítulos mais pertinentes para o caso português e dei com dois aspectos que me parecem muito importantes.Defende o FMI que «a cut in face value (debt reduction) … [and] a lengthening of maturities (debt rescheduling) … both types of debt operations can involve a “haircut,” i.e., a loss in the present value of creditor claims.» Muito claro: a reestruturação que o manifesto defende é considerada pelo FMI um haircut, pois, como explica mais adiante, «most market observers use a present value approach to calculate the scope of creditor losses (or “haircut”) implied in a debt exchange». No mesmo documento lê-se: «Debt restructurings can have drastic adverse consequences for economic growth, trade, capital flows, banks and other financial institutions.» É difícil ser mais claro. Não admira, portanto, que o FMI se tenha agora pronunciado contra a solução defendida pelos 70. Suponho mesmo que, se algum dos 70 tivesse tido acesso ao documento do FMI antes de assinar o manifesto, se teria abstido de o fazer.

Mário Amorim Lopes publicou também n’O Insurgente um Manifesto por um Orçamento Equilibrado que teve um êxito que surpreendeu o próprio promotor, tendo atingido até agora a bonita soma de 592 subscritores. Este outro manifesto rebate ponto por ponto os argumentos a favor da reestruturação defendidos pelos 70.
No mesmo blog, Rodrigo Adão da Fonseca juntou alguns argumentos pertinentes, como a reestruração não depender da vontade dos portugueses, de parte substancial da dívida estar em mãos nacionais e finalmente que reestruturar equivale a adiar as reformas.

No Corta Fitas, José Mendonça da Cruz conclui que «Ferreira Leite, Capucho, Bagão e António Saraiva querem um programa socialista e estatizante» e lamenta a «triste companhia...», fazendo ainda notar que o manifesto ignore ou desvalorize «todas … as melhorias dos indicadores. Ignora a descida do défice, a diminuição do desemprego e o aumento do emprego; ignora o aumento persistente das exportações; ignora a novidade do saldo positivo da balança comercial -- uma novidade de décadas; ignora o saneamento das empresas públicas de transportes e outras; ignora a queda das taxas de juro para níveis baixos recorde; ignora a racionalização dos gastos na saúde e na justiça; ignora a contenção salarial; ignora, convenientemente, a acção do ministério das Finanças e do IGCP» e conclui que o desejo dos signatários é que «os estrangeiros que paguem a crise». Vasco Lobo Xavier mostra que a comparação da situação actual de Portugal com a da Alemanha do pós-guerra é disparatada.

Mais recentemente, e saindo do mundo da blogosfera, José Gomes Ferreira escreveu uma carta, publicada na página da SIC-Notícias, dirigida a «João Cravinho, Manuela Ferreira Leite, Bagão Félix, Ferro Rodrigues, Sevinate Pinto, Vitor Martins e demais subscritores do manifesto», em que apresenta as previsíveis consequências de se tentar negociar uma reestruturação da dívida e lembra que «Portugal já fez e continua a fazer uma reestruturação discreta da nossa dívida pública», carta esta que originou ainda mais comentários e respostas.

Por tudo isto, e muito mais que poderia acrescentar, abstenho-me de comentar o manifesto dos 70 (que afinaL são 74, ao que parece), já que as razões que poderia apresentar para a minha profunda discordância já foram mais que debatidas. Limito-me a dizer que apenas o facto de estarem entre os subscritores Louçã e Boaventura Sousa Santos deveria ter sido suficiente para pessoas como Manuela Ferreira Leite desconfiarem e não associar o seu nome a esta manobra.

terça-feira, 11 de março de 2014

Portugal antes do 25 de Abril

Dei com esta prosa de Vasco Pulido Valente no Portugal dos Pequeninos:

«O primeiro-ministro anunciou que Portugal não voltará tão cedo, se voltar, à relativa prosperidade de 2011. Outras personagens que o apoiam e o aprovam prevêem tranquilamente o empobrecimento progressivo do país. Nenhuma delas parece ter vivido os tempos de fome e desespero que duraram muito mais de 40 anos, durante a República, Salazar e Caetano. Com 30 anos no “25 de Abril”, não me esqueci depressa do que era a vida nessa altura. Não falo da esquálida miséria do campo, que numa região rica a uns quilómetros de Lisboa, em que as pessoas trabalhavam o dia inteiro, envelheciam depressa e morriam de qualquer maneira, sem diagnóstico e sem assistência. Como não falo da província – do Minho ao Algarve – onde o horror se tinha tornado a normalidade. Na falta de uma experiência directa, seria um impudor. Mas não me importo de falar da classe média (de resto privilegiada) em que nasci: e posso dizer que a pobreza contaminava tudo. O que se vestia, o que se comia, o que se fazia, o que se pensava. Mais do que na gente que mandava no Estado e no cidadão comum, a tirania estava, como dizia o outro, na necessidade de poupar, na privação perpétua da frivolidade e do prazer, no mundo imóvel e sem saída, que pouco a pouco se tornava numa prisão a céu aberto. As dores de crescimento num liceu de crianças caladas, que muito manifestamente esperavam o pior e, a seguir, numa Faculdade, que se destinava a premiar os filhos de família e a submissão, não levavam a uma descoberta ou sequer a uma aprendizagem, no seu melhor levavam a uma espécie de punição que moía e predispunha à desistência e ao cansaço. O Portugal de hoje não conseguiria nunca perceber o Portugal de 1950 ou de 1960. Agora, até se glorifica o crescimento da economia e a estabilidade financeira do regime. O primeiro-ministro com certeza nunca se deu ao trabalho de imaginar aquilo a que a pobreza haveria condenado um rapazinho de Trás-os-Montes com uma mediana boa voz. Nem lhe descreveram o deserto que foi Lisboa nessa época de chumbo, onde ir ao café ou a um cinema de “reposição” tomavam as proporções de um acontecimento. Os sinais que o país começa a voltar atrás são claros. Verdade que a civilização que entretanto se criou não vai desaparecer. Mas nada disso consola se imitações substituírem o que existia antes e acabarmos na mediocridade e na tristeza de uma simples sobrevivência sem destino.»

Parece que Pulido Valente e eu não vivemos nessa época no mesmo país. VPV faz bem em não falar da província "onde o horror se tinha tornado normalidade", já que confessa não ter experiência directa. Eu também não falarei porque a minha experiência foi limitada, embora essa experiência limitada me leve a rejeitar a designação de "horror" e a narrativa de que "as pessoas ... envelheciam depressa e morriam de qualquer maneira". Parece que VPV se sente mais à vontade a falar da classe média  e de Lisboa. Mas o que diz não é da classe média a que eu pertenci (e pertenço) e da Lisboa que eu conheci. Para VPV "a tirania estava ... na necessidade de poupar", como se poupar fosse um horror e não uma necessidade universal e constante em qualquer época e lugar excepto para alguns privilegiados. A tirania estava ainda "na privação perpétua da frivolidade e do prazer". Talvez VPV nunca tenha sentido prazer, mas não eleve essa sua impossibilidade em regra geral. Já a privação de frivolidade não me parece assim tão grave. Quanto ao "liceu de crianças caladas" não condiz com o meu liceu de crianças bastante barulhentas. Também não conheci, no ensino superior, a "submissão" e a susência de "aprendizagem", a "punição que moía e predispunha à desistência e ao cansaço". Se "ir ao café ou a um cinema de "reposição" tomavam as proporções de um acontecimento", a classe média a que eu pertenci, mesmo a classe média baixa, praticava com razoável frequência estes acontecimentos. Os cafés estavam cheios, assim como os cinemas, e não era só de membros da classe alta, que não era tão numerosa que permitisse encher os numerosos cafés e os grandes cinemas. Todos os bairros populares tinham o seu cinema de réprise onde por pouco dinheiro se viam dois filmes por sessão. O "deserto que foi Lisboa" estava muito bem povoado. VPV dever ter tido uma vida muito infeliz!

domingo, 9 de março de 2014

Paridade de género

No passado Dia da Mulher, Arménio Carlos comandou uma pequena manifestação organizada pela CGTP "pela igualdade salarial e o direito à maternidade". No final uma jornalista fez-lhe uma pequena provocação, perguntando para quando uma mulher à frente da CGTP. Arménio Carlos pareceu um pouco atrapalhado, mas respondeu, recompondo-se logo, que em 2016 haverá nova eleição para o secretariado e será o colectivo da CGTP a escolher, cabendo a este órgão a decisão de se será homem ou mulher. Se eu fosse jornalista levaria a provocação mais longe e teria perguntado se já foi decretado na CGTP a paridade de género no colectivo.

sábado, 8 de março de 2014

Manifestação de polícias

Ponto positivo: Desta vez não houve invasão da escadaria. Apesar de a pressão dos manifestantes ter conseguido fazer recuar o primeiro cordão de segurança alguns passos e alguns degraus, não conseguiu ir além disso.

Outro ponto positivo: Os dirigentes associativos promotores da manifestação colaboraram para que a invasão não se desse.

Ainda outro ponto positivo: As forças destacadas para a defesa do edifício do Parlamento tiveram um comportamento exemplar e eficaz. O Ministro Miguel Macedo deve estar satisfeito.

Ponto negativo: Grande parte dos manifestantes gritava "Invasão!" e tentou forçar os cordões de segurança para que se repetisse a situação de Setembro. Quando uma parte importante das nossas forças de segurança pretendem praticar um acto que sabem ser ilegal e contra a vontade das suas chefias e dos seus representantes sindicais, é difícil que os portugueses continuem a sentir-se seguros.

Outro ponto negativo: A comunicação social, nas vésperas da manifestação, mostrou à exaustão as imagens da invasão de Setembro, quase a incitar a sua repetição. Depois da manifestação, o que foi objecto de notícia foi o número de feridos e de indivíduos identificados e não o comportamento das partes em presença.

quinta-feira, 6 de março de 2014

quarta-feira, 5 de março de 2014

O valor da palavra

A atitude de Passos Coelho Ministro ao recusar responder à questão da deputada Catarina Martins depois desta declarar que a palavra do Primeiro Ministro "não vale nada" pode não estar de acordo com o regulamento da AR mas foi a única atitude digna de um homem sério. Se o valor da sua palavra era o que a deputada do BE lhe atribuia, não teria lógica continuar a usar a palavra para quem não lhe dava valor. Seria mesmo de esperar que, depois de classificar deste modo a palavra do PM, Catarina Martins não solicitasse que este respondesse a qualquer questão, visto que, para ela, a resposta teria necessariamente um valor nulo. Se a recusa de responder por parte de Passos Coelho foi, ao que julgo, inédita, a saída do hemiciclo do grupo parlamentar do BE também não é um facto habitual. Estranho é esta retirada ter sido acompanhada pela saída de Canavilhas, Sérgio Sousa Pinto, Galamba e Lacão. Estes deputados do PS, ao acompanhar o BE, colocam-se claramente junto de quem usa o insulto como arma de debate político, já que classificar de nula a palavra de alguém é objectivamente um insulto. É também significativo que mais nenhum deputado se tenha solidarizado com o BE, nomeadamente os do PCP.

segunda-feira, 3 de março de 2014

A pergunta "E agora, Ucrânia?" continua sem resposta

A situação na Ucrânia continua tensa, principalmente na Crimeia. Apesar dos numerosos apelos ao diálogo, à contensão e a soluções pacíficas, mantêm-se o perigo de poder desencadear uma guerra de dimensões desconhecidas. As ameaças que têm vindo de diversos responsáveis ocidentais dirigidas à Rússia parecem-me pouco eficazes, para não dizer deslocadas. É claro que Putin conhece muito bem os perigos que corre e saberá como actuar para os minimizar, sabendo que o efeito surpresa é eficaz e que o Ocidente tem pouco espaço para acção eficaz. A informação continua a ser incompleta e pouco isenta. As palavras de Miguel Sousa Tavares há pouco no jornal das 8 da SIC foram as mais adequadas que ouvi até hoje sobre o assunto. Discordo muitas vezes e Miguel Sousa Tavares, mas por vezes é um dos poucos a dizer as verdades. Que a Crimeia é essencialmente russa pela história desde o século XVIII e pela população ainda hoje é um facto. Foi oferecida à Ucrânia por um capricho de Krushtchov numa altura em que isso politicamente não tinha qualquer efeito prático. Considerar essa dádiva irreversível, sem ter em consideração a vontade da maioria da população parece pouco democrático. Provocar uma guerra por isso, parece irresponsável. Sousa Tavares já tinha afirmado que os russos não iam ficar de braços cruzados. Acertou. É provável que continue a acertar agora.

Não é homofobia

Helena Matos, mais uma vez, põe o dedo na ferida. Sem medo de que a possam considerar homofóbica,  diz umas verdades:

«O medo de se ser declarado homofóbico leva a que não se questione o acerto de tomadas de posição como esta: Banco Mundial suspende ajuda ao Uganda por causa de lei anti-gay. Em causa, uma ajuda de 90 milhões de euros para melhoria do sistema de saúde  A legislação do Uganda sobre a homossexualidade é criminosa e haverá formas de penalizar os dirigentes do Uganda por causa dessa legislação. Não tenho dúvidas que qualquer tipo de sanção se traduzirá num agravar das condições de vida da população do Uganda mas  suspender uma ajuda destinada ao sistema de saúde não passa de um gesto para ocidental ver a paludir nas redes sociais.»

domingo, 2 de março de 2014

E agora, Ucrânia

A evolução dos acontecimentos na Ucrânia levou este país, a região e o mundo a uma situação muito grave com perigo de guerra. E digo apenas "perigo" porque ainda não foi disparado um tiro. Não se deve portanto falar ainda de situação de guerra, mas de perigo de guerra, apesar de as autoridades de facto da Ucrânia dizerem que a Rússia declarou implicitamente guerra com os seus actos.

Mas o modo como os acontecimentos têm sido noticiados deixa muitas dúvidas sobre aspectos importantes, direi mesmo fundamentais. Em primeiro lugar: Foi atingido um consenso e, segundo creio, assinado um acordo a 21 de Fevereiro, com a mediação dos ministros dos Negócios Estrangeiros da França, Polónia e Alemanha, entre Iakunovitch e 3 líderes da oposição. Este acordo previa a antecipação das eleições presidenciais e mudanças na Constituição. Logo depois do anúncio deste acordo houve tiroteio na Praça da Independência que provocou vários mortos e o parlamento decidiu a destituição do presidente, tendo resultado a reviravolta que levou rapidamente às reacções que se conhecem. Ao que parece o tiroteio mortal não foi uma troca de tiros, mas sim foram disparos de atiradores furtivos não identificados. Parece que se tratou de uma manobra para desestabilizar a situação e evitar que o acordo entrasse em vigor. Quem a provocou? Não vi ainda esta questão ser esclarecida nem sequer posta claramente. Outra dúvida pertinente é se a destituição do presidente foi legal, se o parlamento tinha essa competência. Além disso não se sabe se a nomeação do presidente interino, a queda do governo que se seguiu e a constituição de novo governo e as outras mudanças tiveram qualquer base legal. O presidente deposto, Iakunovitch, diz considerar-se ainda o presidente legal e a Rússia defende a mesma posição. Terão alguma razão? A UE e vários países europeus assim como também Obama reconhecem as novas autoridades, mas não ouvi ainda justificações legais para este reconhecimento. Pode defender-se que se tratou de actos revolucionários e que a legalidade é uma legalidade revolucionária (como o nosso 25 de Abril, por exemplo, com a diferença de que a situação anterior na Ucrânia era formalmente de democracia), mas a reacção dos líderes ocidentais não foi a mesma noutros casos de golpes de estado que substituiram as autoridades noutros países (Vem-me a memória, por exemplo, os casos da Guiné-Bissau e do Egipto). Outra questão pouco falada (e de todo não falada nas televisões) é a das alegadas ligações de parte dos manifestantes ucranianos a movimentos da extrema direita. A ser verdade resta saber que real influência podem ter.

Para além das dúvidas legais, que se calhar até são só minhas por estar mal informado (e da Rússia), o caso é que a situação da Ucrânia, com guerra ou sem guerra, é muitíssimo grave. Claro que se houver guerra declarada, não há dúvida que será muito mais trágico, mas mesmo sem guerra, mesmo que se chegue a um acordo ou a uma situação de facto com alguma estabilidade, como esperará a Ucrânia resolver a grave situação financeira? O empréstimo que a Rússia tinha acordado e que, evidentemente, não será já concedido, terá de ser compensado de qualquer modo. Estará o FMI pronto para ajudar? E a que preço (austeridade, reformas, etc.)? A Ucrânia terá alguma possibilidade de viabilidade energética sem o gás da Rússia ou com o gás a preço de mercado? Será que os ucranianos estarão condenados a passar frio e a não terem electricidade? Estranho que estas questões não sejam levantadas, enquanto os noticiários repetem e repetem as mesma reportagens sem procurar mais explicações para aspectos tão importantes como estes.