quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Provérbio actual

A ideia peregrina de proibir nos bares e cantinas dos hospitais a venda de produtos que contenham açúcar e sal em quantidades consideradas prejudiciais para a saúde levanta-me sérias dúvidas sobre a facilidade de implementação e a probabilidade de ter efeitos benéficos. Não conheço em pormenor como se pretende definir os produtos em causa, mas, a acreditar em algumas notícias que têm vindo a lume, são considerados abrangidos os bolos, segundo outros apenas os bolos com creme, além disso produtos que me parecem tão inofensivos como os croissants estarão também entre os banidos. Também ouvi falar em sanduíches de chouriço ou de presunto. A mousse de chocolate está na lista das proibições. Todas estas notícias, que não sei se exactas, deixam-me bastante céptico. Se um frequentador de um hospital, seja doente ou acompanhante, ou ainda funcionário, quiser lanchar ou simplesmente comer alguma coisa para matar a fome, que poderá ter à sua disposição? Ouvi falar em iogurtes e bolachas sem açúcar e sem sal. Será que sanduíches de fiambre ou de queijo já são permitidas? Ou apenas se o queijo e o fiambre tiverem pouco sal. Quem e como se mede a quantidade de açúcar e de sal dos produtos? E, se o fumo é permitido, excepto em locais públicos fechados, apesar de ser comprovadamente muito prejudicial à saúde, porque não se faz uma campanha de educação nutricional e se deixa ao critério de cada um se quer ou não sacrificar a gulodice para proteger a saúde. E afinal tanto o açúcar como o sal estão livremente à venda e ninguém poce controlar a quantidade que cada um usa em sua casa. Também nos restaurantes há saleiros e distribuem-se livremente pacotinhos de açúcar destinados a adoçar o café, mas que podem ser usados à discrição. Parece-me que está em vigor o provérbio: Se uma coisa é boa e apetece, ou é pecado ou prejudica a saúde.

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Lei indigna suscita indignação

Completamente de acordo com rui a., com Patrícia Reis e com Pedro Correia. Nada a acrescentar.

domingo, 24 de dezembro de 2017

Mau português

Os erros de português veiculados por vários canais de televisão através de alegados jornalistas são constantes e dão uma triste imagem da respectiva cultura linguística. Vejamos alguns exemplos recentes:

- "Os jogadores não conteram as lágrimas." - Até o meu corrector ortográfico ficou tão indignado que sublinhou "conteram" a vermelho, como faziam os meus professores de português.
Outros disparates que consegui respigar, mas em que falhei em tomar nota das frases completas:
- interviu
- haverão - O erro de esquecer que o verbo haver é impessoal é muito frequente, não só em jornalistas, mas até em políticos, mesmo ministros.
- uma grama - e - duzentas gramas

Certamente "haverão"... perdão, haverá de futuro, infelizmente, muitas mais ocasiões de apontar erros.

sábado, 16 de dezembro de 2017

English

A propósito da minha declarada embirração pela língua inglesa (e pela mania de usar no nosso Portugal palavras e expressões inglesas) referi o facto de as mesmas letras ou conjunto de letras terem em inglês frequentemente pronúncias muito diferentes. Claro que também em português há alguns casos em que isso acontece, mas em muitíssimo menor número. Referi que Bernard Shaw já se queixava do mesmo, chegando a afirmar, com base no modo de pronunciar várias palavras, que a palavra "fish" se poderia escrever "ghoti". Mas não só se queixava como apresentou propostas de adopção de uma escrita inglesa reformada e até de um alfabeto de 40 letras que permitiria escrever em inglês sem essas ambiguidades. As propostas de Shaw parecem-me irrealizáveis, mas merecem ser analisadas. Ainda sobre este assunto, encontrei referência a um poema que eu não conhecia, "The Chaos", de um professor holandês chamado Gerard Nostl Trenité, que é um verdadeiro repositório de casos de ambiguidades de pronúncia de palavras inglesas.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

Portuguese language

A língua portuguesa é a quarta mais falada no mundo, com 215 milhões de falantes, talvez a quinta, com 279,2 falantes (incluindo 236,1 milhões como língua nativa e 36,8 como 2.ª língua),  ou ainda a sexta, com 170 ou 205 a 270 milhões, conforme as fontes. Em qualquer caso é uma das línguas mais importantes de entre as cerca de 6000 línguas faladas no mundo. É, além disso, uma língua rica a que não faltam palavras e expressões para uma comunicação em qualquer domínio, seja técnico, seja artístico ou ainda na literatura.

No entanto parece que muitos portugueses pensam que é preferível usar o inglês para comunicar. Há dias vi na TV com algum espanto que o Zoo do Algarve pretendia cativar as crianças a depositar num receptáculo as cartas ao Pai Natal com uma tabuleta em que se lisa "Letters to Santa". De seguida dei com as notícias de que na FIL haveria "workshops" e "show rooms" para o Natal (ou seria para Christmas?) e no Pátio da Galé se preparava um "Xmas Creative Market", enquanto que no Parque Eduardo VII decorria um evento chamado LISBONLAND. Mas estes exemplos não são raros e parece que qualquer coisa ganha em qualidade e em fama se tiver uma designação estrangeira, em particular em inglês. Não havia necessidade. O português devia bastar-nos.

Confesso que a língua inglesa me desagrada. Sempre me desagradou, principalmente pelo facto de a mesma letra ou conjunto de letras poder ter pronúncia diferente conforme a palavra em que se integra. Já Bernard Shaw se queixava do mesmo. Como saber se o "i" se dever ler "i" ou "ai"? Se existe o "i" porque utilizar o conjunto "ee" para o mesmo som? Como pronunciar o "th"? Depende da palavra. O aeiou, que em português apresenta 5 sons simples que correspondem às 5 vogais primárias, em inglês deve ler-se ei-i-ai-ao-iu (em pronúncia portuguesa). Quer dizer: 4 das 5 vogais principais devem ler-se como ditongos! Parece-me aberrante. Além disso, por falta de palavras para todas as situações, os ingleses preferem juntar duas ou mais palavras para significados que poderiam ser dados, e às vezes são em alternativa, por apenas uma palavra, como, por exemplo, "go up" para subir, "cut off" para recortar, e numerosos outros exemplos. Pensava ainda que o inglês era uma língua feia, que não poderia ter a beleza do italiano ou do francês, mas mudei de ideias, há muitos anos, quando um amigo meu inglês me ofereceu um disco com sonetos de Shakespeare. Reconheço, desde então, que pode ser uma língua bela, mas na linguagem de todos os dias não o é, certamente. Por estas razões me parece ainda mais aberrante o uso de inglês para portugueses, como nos exemplos acima.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Viver acima das nossas possibilidades

Desde 2011 que se discute se a causa da crise em Portugal foi o facto de termos vivido acima das nossas possibilidades ou não, ou, se não foi a causa, se foi, pelo menos, um factor agravante. Muitas vozes, principalmente de esquerda, consideraram que é mentira dizer que se tinha vivido acima das possibilidades. Mas não só da esquerda: por exemplo, um vereador do PSD da Câmara de Abrantes, em 2011, reagindo a um discurso de Cavaco Silva, afirmava que "não se incluía nesse grupo [o grupo dos que viviam acima das suas possibilidades] , assim como grande parte dos portugueses que conheço e que nunca compraram nada sem ter o dinheiro para pagar a pronto". O coitado não compreendeu que ter dinheiro para pagar a pronto não significa que quem lhe paga esse dinheiro, seja o Estado ou uma qualquer instituição privada, não esteja a pagar acima das possibilidades próprias. Mais recentemente, Pedro Marques Lopes, que ainda não percebi bem se é de direita, do centro ou de alguma esquerda, considera que a afirmação de que "vivemos acima das nossas possibilidades" é uma "mentira". Será? Recorro, para procurar saber se estas reacções são justificadas, a um artigo mais recente, de 2015, em que André Azevedo Alves, perante as acusações que foram feitas à gestão do Governo de Pedro Passos Coelho, cita João César das Neves, que dizia que "a indiscutível redução do défice foi conseguida sobretudo à custa de medidas contingentes e temporárias, com poucas reformas na máquina" e que "a tão falada consolidação orçamental está ainda muito longe", reconhecendo André Azevedo Alves, no entanto, que "o executivo liderado por Pedro Passos Coelho foi ainda assim além do que teriam feito quaisquer das alternativas governativas no contexto partidário português. E que só isso evitou um colapso do Estado português que estava iminente em 2011". O gráfico que Azevedo Alves apresenta, reproduzido de Jorge Costa, é explícito:



Desde 1975, vivemos, sem margem para dúvida, acima das nossas possibilidades. Nas próprias palavras de Jorge Costa: "como se deixássemos aos nossos herdeiros dívidas sem qualquer contrapartida, por termos vivido, isto é, consumido sistematicamente acima dos nossos rendimentos e do valor dos nossos bens de capital, sendo esses herdeiros forçados a pagar essas dívidas com os seus rendimentos - rendimentos do trabalho, visto que, se lhes transmitimos algum capital, esse capital é negativo".


segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Eurogrupo e austeridade

O grande equívoco que está intimamente ligado à eleição de hoje do Ministro das Finanças português Mário Centeno para o cargo de Presidente do eurogrupo foi exemplarmente posto a nu no comentário de Mariana Mortágua ao afirmar que "A pergunta que os portugueses fazem é se será Mário Centeno, por ser português e pertencer ao PS, pode fazer a diferença nesta instituição que só tem representado ataques à democracia e mais austeridade". É evidente que nem o cargo de Presidente permite provocar qualquer alteração à instituição eurogrupo, nem Centeno parece a pessoa capaz de tal feito, mesmo que tivesse mais poderes. O Presidente do eurogrupo representa os ministros das finanças dos 19 países que o constituem e, sendo seu representante e não seu chefe ou dirigente, não deve provocar alterações substanciais nos objectivos da instituição de modo a "fazer a diferença". A resposta à pergunta de MM só poderá um rotundo Não, como a própria reconhece ao acrescentar "Entendemos que prevalece a natureza da instituição". Mas o que a frase de Mariana Mortágua mostra é que para a extrema esquerda portuguesa o eurogrupo representa "ataques à democracia e mais austeridade". Custa a admitir esta visão segundo a qual o Governo que MM apoia no Parlamento acabou com  a austeridade em Portugal, mas nos restantes países do eurogrupo continua a reinar austeridade por culpa das regras do mesmo eurogrupo.