quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Ainda o Magalhães

A maior graçola que Sócrates debitou na entrevista que concedeu a Ricardo Araújo Pereira no programa de esmiuçamento do Gato Fedorento foi afirmar que todos os alunos do ensino básico já têm computador. Se fosse verdade não teria sentido a dúvida que se põe se vai continuar a distribuição de Magalhães nas escolas do 1.º ciclo (a não ser para os novos alunos agora entrados no ciclo, evidentemente). Mas a verdade (se é que se pode falar em verdade sem sermos acusados de salazarismo!) é que há escolas em que nem no ano passado foi distribuído um único Magalhães nem no ano lectivo que agora começou se falou sequer no assunto. Tenho netos de diferentes idades a frequentar escolas públicas e só vejo computadores desligados e arrumados sem qualquer uso e não mais do que um por sala.

Manuela Ferreira Leite e Salazar

Nunca pensei que houvesse quem se lembrasse de tentar associar Manuela Ferreira Leite a Salazar. Muito menos que essa associação tivesse como base o elogio que ambos fizeram, com 81 anos de intervalo, do uso da verdade em política. Sim, MFL está a ser acusada de salazarismo por ter feito da verdade um dos apelos da sua campanha.

Por outro lado, não terá passado pela cabeça do acusador de serviço que entre os inúmeros escritos de Salazar alguns haverá certamente que não defendem ideias condenáveis? Defender o uso da verdade em política será exclusivo da extrema direita? Será por pensar assim que se generalizou o uso de mentiras nas campanhas de certos sectores?

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Espionagem, escutas, PR e assessor

Como é possível haver tantas pessoas a escrever e a dizer coisas, por vezes contraditórias, sobre o estranho caso da espionagem ou das escutas em Belém e sobre o assessor que disse ou encomendou, com ou sem indicação ou autorização ou ordem do PR, que se desse publicidade às desconfianças da dita espionagem ou das ditas escutas, a um jornalista que pediu a um colega que investigasse por um e-mail, o qual terá sido espiado ou foi propositadamente enviado ou talvez desviado ou soprado e que veio publicado num outro jornal que não o dos jornalistas citados, o que levou o PR a demitir o dito assessor para mostrar que a ordem, sugestão ou indicação para dizer ou encomendar a referida desconfiança de haver escutas ou espionagem não tinha sido dada por ele, demissão que poderá favorecer ou não o PS nas próximas eleições, o que talvez tenha sido ou não propositado da parte de algum dos intervenientes? Bem, pela longa frase parece que realmente há muito que dizer ou escrever sobre o assunto, mesmo sem se saber praticamente nada de certo sobre o dito assunto.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Manuela: sentido de humor surpreendente


Pode haver dúvidas sobre que ganhou outro dia o debate entre Sócrates e Manuela Ferreira Leite. Tanto que pode haver que as houve: uns opinaram que ganhou S, outros que ganhou MFL, e ainda alguns, para não se comprometerem, afirmaram que houve um empate.

Mas hoje, graças a um conhecido grupo de humoristas que tenta desde ontem esmiuçar o sufrágio dos portugueses, poucas dúvidas restarão que em entrevistas ao Gato Fedorento Manuela ganhou em toda a linha. Mostrou calma, segurança, sentido de humor e fair play. Principalmente mostrou à-vontade e foi natural. Foi ela própria, porém surpreendentemente bem disposta e até um pouco brincalhona, sem deixar de ser sincera, ao contrário do entrevistado da véspera, que deu sinais evidentes de estar nervoso e pouco à vontade, respondendo o politicamente correcto e sem graça, embora se tivesse rido muito.

Dito isto, devo confessar que não penso que seja inevitável que o facto de se portar melhor num programa humorístico, embora com perguntas muito sérias, indique alguém para o cargo de primeiro-ministro. Assim como o facto de alguém fazer gafes ou de não gostar de comícios não é sinal de que não pode ser bom primeiro-ministro. As qualidades que penso que um bom primeiro ministro deve ter são outras (excepto a sinceridade, de que se tem sentido a falta ultimamente). Mas foi refrescante assitir a uma boa entrevista, com humor, mas no fundo muito séria.

domingo, 13 de setembro de 2009

Energia alternativa em Évora: refrigeração a leque


A avaliar pelas imagens que acabo de ver na TV (Jornal da RTP2) do aspecto da sala durante o discurso de Carlos Zorrinho, responsável pelo chamado Plano Tecnológico, a anteceder a intervenção de José Sócrates, ficou claro que a energia alternativa mais apropriada para arrefecer os rostos afogueados dos militantes socialistas presentes, principalmente das militantes, era a refrigeração a leque. Se o uso do leque for imposto durante o Verão em todos os edifícios públicos como uma norma do Plano Tecnológico, a poupança de energia com base em combustíveis fósseis será enorme e evitar-se-á a emissão de muitas toneladas de CO2 para a atmosfera, retardando assim o aquecimento global. Vamos pois todos abanarmo-nos com leques.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Capela de Santo Amaro

Vi no Lisboa S.O.S. com desgosto imagens do estado de degradação a que chegou a Capela de Santo Amaro.


Quando frequentei o Liceu de D. João de Castro, de que consta querem desactivá-lo como estabelecimento de ensino, apesar das condições ímpares que apresenta para esse fim, morei durante anos na Rua dos Lusíadas e visitei várias vezes a Capela de Santo Amaro, então já abandonada, mas ainda não vandalizada nem grafitada. Fazia-o com deleite e custa-me muito ver o estado a que chegou. Felizmente parece possível a recuperação, assim haja vontade e meios.
Perante casos como este, infelizmente não raros, custa-me pensar que há quem defenda os graffiti como uma forma de arte sem condenar o seu emprego sobre artes mais antigas e que deveriam ser preservadas. Pode ser que sejam uma forma de arte – popular e contemporânea – quando não se limitam a rabiscos ou a iniciais mais ou menos elaboradas que se destinam prioritariamente a delimitar territórios, mas mesmo quando incluem desenhos que podemos considerar artísticos deveriam seleccionar como base muros ou paredes que não pertencessem a monumentos e que não fossem desfeados com a cobertura de graffiti. Até um grande artista deveria ser alvo de crítica se resolvesse pintar sobre um monumento antigo.

domingo, 6 de setembro de 2009

A saúde nos programas eleitorais

A acusação tem sido repetida nestes últimos dias: Sócrates diz que o programa eleitoral do PSD não refere uma única vez o Serviço Nacional de Saúde (SNS), o que acha particularmente grave e sinal de que aquele partido está contra o sistema de saúde público. Sócrates insere esta ideia na estratégia geral que, segundo ele, o PSD persegue de privatização geral, entregando à iniciativa provada até a saúde, a Segurança Social e a educação.
Resolvi verificar o fundamento da acusação principal -- a ausência de referências ao SNS no programa do PSD -- e das conclusões que Sócrates tira daí.
Se bem que seja verdade que não encontrei a expressão "Serviço Nacional de Saúde" uma única vez no programa do PSD, verifiquei que a palavra "saúde" aparece no texto 35 vezes, enquanto que o programa do PS cita a palavra 121 vezes. Mas daí não se pode concluir que o PS se preocupe mais com a saúde dos portugueses, já que o seu programa é muito mais extenso e pormenorizado, tendo 130 páginas, enquanto o do PSD tem apenas 39. Portanto a palavra "saúde" aparece uma média de 0,90 vezes por página no documento do PSD e 0,93 no do PS. A diferença não é pois significativa.
Vi ainda que a expressão "Serviço Nacional de Saúde" ou a sigla "SNS" só são citadas pelo PS 22 vezes, pelo que se vê que se pode dizer muito sobre política de saúde mas referindo o respectivo serviço público pelo nome apenas 18% das vezes (0% pelo PSD).

Mas o programa do PSD inclui designadamente expressões como:

«serviços públicos básicos – como a saúde

Plano Nacional de Saúde

serviços públicos de saúde

política de saúde»,

defende:

«maior acessibilidade aos serviços de saúde»

e afirma:

«Desenvolveremos políticas específicas de saúde infantil

comprometemo-nos com a universalidade no acesso aos cuidados de saúde

Alargaremos progressivamente a liberdade de escolha pelo utente dos prestadores de serviços de saúde: o beneficiário passará a poder escolher cada vez mais, dentro ou fora do sistema público, o hospital ou o centro de saúde da sua eleição

Defenderemos uma gestão integrada da Rede de Cuidados de Saúde»

Parece-me inevitável concluir que, embora se possa discordar da política de saúde do PSD -- e não espanta que Sócrates discorde --, o que não é legítimo é acusar o PSD de estar contra o Serviço Nacional de Saúde, só por não o referir expressamente pelo nome. Se eu disser "o actual primeiro-ministro", toda a gente sabe a quem me estou a referir, mesmo não lhe dizendo o nome.

sábado, 5 de setembro de 2009

Liberdade de imprensa - liberdade de expressão

O recente episódio do afastamento da jornalista da TVI Manuela Moura Guedes do Jornal Nacional de Sexta-feira já foi tão escalpelizado (ver aqui, aqui e aqui) que será difícil dizer mais. Mas não vi ainda ninguém defender a tese que me parece evidente de que os ataques verbais continuados do primeiro-ministro e do secretário-geral do PS, que por acaso são uma e a mesma pessoa, ao dito Jornal Nacional e à sua apresentadora foram objectivamente modos de pressão sobre o conteúdo jornalístico daquele programa. Não sei, ninguém sabe (a não ser os intervenientes anónimos), de quem partiu a ordem do afastamento, pode ter sido dalguém do PS, mas também pode não ter sido. Provavelmente nunca viremos a saber bem como e porquê as coisas aconteceram assim. Mas as pressões anteriores têm um rosto, lembramo-nos delas e foram recordadas, estão gravadas, é um facto objectivo.
Agora, defender, como fez Mário Soares, que se trata de um simples problema de uma empresa e que o governo não tem nada a ver com o assunto ou é ingenuidade ou má-fé. Por outro lado, considerar que se trata de um assunto legal ou apenas discutir se o Jornal Nacional das sextas apresentado por Manuela Moura Guedes tinha ou não qualidade, se era ou não populista, se gostávamos ou não de o ver, são visões redutoras da questão. Mesmo admitindo que o Jornal Nacional da Manuela Moura Guedes era deplorável e populista, o que não me parece pelos poucos minutos a que assisti, a censura evidente exercida por alguém sobre o programa é um atentado à liberdade de expressão.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Debates e comentários

Têm-se ouvido já de há muito numerosas vozes críticas sobre a falta de discussão de ideias nas campanhas eleitorais e designadamente nos debates. Estas críticas são muitas vezes inteiramente justas. Mas quando se ouvem comentadores a expressar a sua opinião sobre os debates só se referem à táctica e à estratégia das discussões e raramente ao conteúdo. Mais parecem comentadores de futebol a falarem do modo como decorreram os jogos, do mérito e demérito dos jogadores e das tácticas dos treinadores. Se a política se parece cada vez mais com o futebol, estes comentadores também contribuem para isso.