domingo, 21 de agosto de 2016

Adeus, privacidade

A privacidade das pessoas, das famílias e das empresas é cada vez menor e tende a tornar-se uma miragem. Cada vez somos mais controlados e temos dados pessoais espalhados e conhecidos por cada vez mais instituições e por mais pessoas. Em muitos casos os próprios colaboram nessa tarefa de exposição dos seus dados e públicos cada vez mais alargados, divulgando perfis pormenorizados em formulários, perfis e outros meios, agora muito mais fácil e rapidamente nas redes sociais ou noutros meios informáticos. Mas é também a gula do Estado por controlar os cidadãos que exige o conhecimento e mesmo por vezes a divulgação de dados pessoais privados.

O exemplo mais recente e mais preocupante é a vontade da Autoridade Tributária e Aduaneira de conhecer o património dos portugueses e estrangeiros residentes. Com o falso pretexto de uma obrigação por normas internacionais, pretende-se obrigar os bancos e outras instituições financeiras a dar a conhecer à ATA os saldos das contas de todos os residentes em território nacional. O pretexto é falso porque as normas citadas apenas exigem que cada país dê conhecimento aos respectivos países da situação de contas abertas nesse país por não residentes , assim como esses países têm obrigação de informar o Governo português das contas que contribuintes portugueses abrem no estrangeiro. Extrapolar para obrigar os bancos a informar as Finanças de todas as contas, de portugueses e estrangeiros, residentes ou não no nosso País é um abuso inadmissível. A Comissão Nacional de Protecção de Dados já considerou, num parecer muito bem fundamentado sobre o ante-projecto de Decreto-Lei que o Governo propôs, essa pretensão como abusiva e inconstitucional. O Governo veio agora limitar a pretendida obrigação de informação às contas de valor superior a 50 000 euros, mas esse valor reporta-se à totalidade de contas do mesmo titular nos diversos bancos. Não vejo como essa soma pode ser feita se cada banco só for obrigado a informar o saldo de contas superiores àquele limiar, já que cada banco não conhece, ou não deve conhecer, que contas um seu determinado cliente tem noutras instituições de crédito. Apurar quem tem contas que no seu conjunto somem mais desse valor obriga evidentemente a que todos os saldos sejam objecto de informação a fim de que se possam somar.

De qualquer modo, com ou sem limiar, é inadmissível e espero que o Decreto-Lei que o Governo pretende aprovar seja obrigado, por uma maioria suficiente de deputados, a ir a apreciação parlamentar e aí seja reprovado, ou que o Presidente da República o vete ou o envie para apreciação no Tribunal Constitucional e aí não passe.

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