terça-feira, 8 de março de 2016

Quanto ganhava a mulher de César?

Nunca o emprego de um ex-ministro ou de um deputado levantou tanta celeuma. Agora discute-se até à agonia o novo emprego de Maria Luís Albuquerque. Não há cão nem gato, nem comentador ou politólogo, nem blog nem órgão de comunicação que não dê amplo espaço à polémica. É o assunto do dia. Muito do que se tem escrito ou dito não merece sequer atenção. Mas há opiniões inteligentes. Destaco as intervenções de Ricardo Arroja n'O Insurgente, de João Miranda e de Vítor Cunha no Blasfémias e de José António Abreu no Delito de Opinião. Como é habitual, estas intervenções traduzem posições diferentes, em certos aspectos mesmo opostas, mas todas são equilibradas e merecem respeito, ao contrário de algumas outras que li ou ouvi por aí. Parece haver unanimidade em reconhecer que, ao aceitar o novo emprego, a ex-ministra e actual deputada não cometeu qualquer ilegalidade. Já as opiniões diferem se o acto foi ou não ético. Tenho alguma dificuldade em afirmar qualquer coisa neste capítulo; a ética está muito longe de ser uma ciência exacta e além disso faltam-me dados para ter uma opinião firme. Mas posso resumir o que penso na seguinte frase de José António Abreu: "Afinal, em que poderá trabalhar um ex-ministro das Finanças se lhe for vedado o acesso ao sector financeiro? Que cargo poderá aceitar um ex-ministro da Economia se a gestão de empresas privadas (a ninguém parece incomodar que possa ir contratar swaps para uma entidade pública) lhe for interdita? (Pense-se em António Pires de Lima, por exemplo.) A que actividade poderá dedicar-se um ex-ministro da Justiça se os escritórios de advocacia (e há imensos negócios cinzentos em torno deles) constituírem terreno onde não possa entrar?" com a qual concordo plenamente. Mas onde a comunicação social falha, a meu ver de modo populista e demagógica, é ao insistir em explicar em pormenor quanto vai ganhar Maria Luís no novo emprego e quanto recebe ao todo somando o seu novo salário com o de deputada. Não que eu veja mal na divulgação em si, estes dados não são secretos e não devem ser tabu. Mas a sua divulgação repetida e em pormenor dá a entender que o principal problema não é nem ordem legal nem ética, mas sim de ordem económica, procurando sentimentos de inveja e mesmo de reprovação repulsa pelos rendimentos avultados. Não, não é aí que reside o problema. Se não é este o fim desta parte das notícias sobre o assunto, então é o miserabilismo militante que de vez em quando vem ao de cima.

2 comentários:

António Pedro Pereira disse...

(A propósito do texto inicial a que o link nos remete)
As cambalhotas argumentativas que certas pessoas dão para manter a lógica de, os amigos são para as ocasiões.
Há que defender sempre os amigos (ideológico-partidários, entenda-se), mesmo que estejam em circunstâncias semelhantes de outros que, por razões igualmente semelhantes, sacrificamos na praça pública.
E o pior é que esta lógica maniqueísta, mesquinha e pouco inteligente, mas, sobretudo, pouco útil para a comunidade de que todos fazemos parte, contaminou quase toda a gente.
poucos que lhe conseguem resistir não passam de cartas fora do baralho que não contam na vida pública.

António Pedro Pereira disse...

O meu comentário anterior é o que deixei no blogue Delito de Opinião, que tem um link para este post.
Pelo que a 1.ª linha, entre parêntesis, não faz sentido aqui.