quinta-feira, 21 de abril de 2016

O Cartão de Cidadão e a linguagem sexista

O Bloco de Esquerda, pela voz da coordenadora Catarina Martins, queixou-se que a designação do documento que veio substituir o Bilhete de Identidade, que recebeu o título de Cartão de Cidadão (depois de se ter especulado que se chamaria Cartão Único, familiarmente chamado CU), representava uma linguagem sexista. Ocorreu-me a ideia de que quem assim pensa é provavelmente obcecado pelo sexo, daqueles que vêem sexo em tudo, mas afastei logo este pensamento maldoso. O que há de sexista nos termos do nome do Cartão de Cidadão? Parece que é apenas o facto de "Cidadão" ser uma palavra do género masculino. Como a palavra nada tem a ver com sexo, parece-me que seria mais correcto dizer que a linguagem é genérica, e não sexista. O argumento de Catarina assenta em que aproximadamente metade dos portadores do dito cartão não serão cidadãos mas sim  cidadãs. Põe-se portanto aqui o problema gramatical dos substantivos que sofrem flexão de género mas que, quando no plural, se utilizam no masculino mesmo existindo elementos dos dois géneros (plural genérico). É o caso de "cidadão". O plural de "cidadão" é "cidadãos" mesmo quando designa um grupo composto por cidadãos e cidadãs. Só se utiliza a forma "cidadãs" quando todos os elementos do grupo são do género feminino. É a regra geral. As regras são feitas para nos compreendermos quando falamos. É certo que nessa designação a palavra "cidadão" está no singular, mas aplica-se e é usado pelo grupo de todos os cidadãos, incluindo as cidadãs que existam nesse grupo. Se "Cartão de Cidadão" contém linguagem sexista, então existe linguagem sexista em numerosíssimas formas de uso comum. Até nas palavras familiares "pais" e "avós". Há o Cartão de Eleitor, que é usado também por eleitoras, cartões de beneficiário, que incluem beneficiárias. As Ordens dos Médicos, dos Engenheiros, dos Arquitectos, dos Enfermeiros, dos Técnicos de Contas e dos Professores englobam, respectivamente médicas, engenheiras, arquitectas, enfermeiras, técnicas de contas e professoras, sem que nenhuma destas profissionais se tenha sentido excluída ou inferiorizada. As assembleias de sócios englobam as sócias. Alguém argumentará que a Sociedade Portuguesa de Autores tem uma designação sexista por pretender representar também as autoras? Estou com Esteves Cardoso.

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